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26 de Abril de 2024

O risco do negócio devolvido ao Rappi/Ifood durante a pandemia do covid-19

Ação Civil Pública do MPT consegue liminar que obriga essas empresas a uma série de medidas

Publicado por Nikolas Costa
há 4 anos

A posição institucional do Ministério Público do Trabalho é pelo reconhecimento do vínculo trabalhista dos motoristas que operam por meio de plataformas digitais, sejam elas de transporte de coisas ou de passageiros.[1] Assim, há uma série de medidas que vem sendo tomadas pelo órgão, no sentido de mudar o entendimento atual dessas relações jurídicas, dando mais segurança a quem realiza esses serviços.

Dentre essas medidas, e tendo em vista a pandemia do coronavírus, o parquet expediu uma série de recomendações às empresas de plataforma, como a Recomendação n.º 092113, de 23 de março de 2020, endereçada ao IFOOD, empresa de entregas por motoboys.[2]

As recomendações continham uma série de medidas sanitárias com o fim de diminuir a propagação do covid-19, tanto entre os que trabalham nas plataformas, quanto os que contratam esse tipo de serviço.

Não havendo o cumprimento espontâneo das recomendações, o Ministério Público do Trabalho resolveu protocolar duas Ações Civis Públicas no Estado de São Paulo (Processo nº 1000396-28.2020.5.02.0082 e 1000405-68.2020.5.02.0056), distribuídas no dia 05 de abril de 2020, tendo como requeridos IFOOD e RAPPI, empresas do mesmo ramo.

Os pedidos dessas ações foram aqueles presentes nas recomendações anteriormente expedidas, havendo também o pedido da antecipação da tutela. Parte desses pedidos foram concedidos, antecipadamente, em decisões prolatadas no mesmo dia da distribuição, ambas pelo Juiz plantonista Dr. Elizio Luiz Perez, que deu prazo de 48h para cumprimento das medidas a partir da intimação dos requeridos, justificado pela urgência do caso e o prévio conhecimento dos pedidos pelas empresas, com multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), em caso de descumprimento.

Assim, o juiz decidiu que as duas empresas mencionadas devem: prestar assistência financeira aos trabalhadores/prestadores de serviço contaminados pelo novo coronavírus, e também àqueles que fazem parte do grupo de alto risco, para que ambos possam manter o isolamento social com recursos necessários para sua sobrevivência; fornecer gratuitamente álcool-gel (70%, ou mais) e água potável aos profissionais; disponibilizar espaços para a higienização de veículos, bags que transportam as mercadorias, capacetes e jaquetas, bem como credenciar serviços de higienização; dentre outras determinações.

A teoria do risco empresarial se assenta no fundamento de que "aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes (ubi emolumentum, ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda)"[3]. Desse modo, a regra é que as empresas assumam o risco do negócio que desenvolvem, pois são as principais beneficiárias do empreendimento, e por ele respondem.

Entretanto, empresas de plataforma como Ifood, Rappi, Uber e 99 se vendem como meras intermediárias entre um prestador de serviço e um consumidor, não assumindo os riscos do negócio, que acaba se concentrando nas mãos do trabalhador/prestador de serviço.

O ex-presidente do Goolge, Vint Cerf, acredita que a tecnologia criou mais empregos do que destruiu[4], caso isso seja verdade, a questão que surge é a da qualidade desses empregos. As decisões aqui analisadas ainda não reconhecem definitivamente o vínculo trabalhista existente entre essas empresas de plataforma e os prestadores de serviço, porém é um importante passo nesse sentido, tendo em vista que, por hora, reconhece a responsabilidade desses aplicativos por esses profissionais, devolvendo o risco do negócio para o empresário.

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Referências:

[1] BRASIL. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO: Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho – CONAFRET. Nota Técnica Conafret nº 01/2020. Disponível em: <http://www.prt2.mpt.mp.br/images/nota-conafret-corona-virus-01.pdf>. Acesso em 07 de abr de 2020.

[2] BRASIL. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO: Recomendação n.º 092113, de 23 de março de 2020. Disponível em: <http://www.prt2.mpt.mp.br/servicos/recomendacoes?task=baixa&format=raw&arq=qFk74mSJUnCRfkNW9.... Acesso em 07 de abr de 2020.

[3]DINIZ, MARIA HELENA. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, v. 7, p. 48.

[4] CALEIRO, JOÃO PEDRO. Os robôs vão acabar com os empregos? Experts estão divididos. Exame, 2014. Disponível em: < https://exame.abril.com.br/economia/os-robos-vao-acabar-com-os-empregos-experts-estao-divididos/>. Acesso em 07 de abr de 2020.

Imagem de Артём Апухтин via Pixabay.

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3 Comentários

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Sempre mantive a convicção de que os serviços prestados por plataformas digitais para entregas e transporte possuem todos os requisitos da relação de emprego, razão pela qual discordo da alegação de que sejam elas meras intermediadoras, agindo sim, como empregadoras. Já li decisões de alguns Tribunais Regionais do Trabalho nesse sentido e vejo nelas a coerência com o que estabelece nosso ordenamento jurídico laboral. Excelente artigo! Congratulo-me com o autor! continuar lendo

Dr., ainda não tenho uma posição definida sobre o assunto, mas minha tendência é pelo reconhecimento de vínculo trabalhista nesses casos, ou pela mudança na dita "intermediação", para que fique realmente mais próxima de uma prestação de serviço. Por hora, concordo com a ação do MPT, no sentido de que independente de haver vínculo ou não, essas empresas se responsabilizem pelo risco do negócio, já que são as maiores beneficiadas. Obrigado pelo elogio, forte abraço! continuar lendo

Informações importantíssimas, os vínculos trabalhistas por meio de plataformas digitais, devem ser reavaliados e reestruturados com base nos direitos dos trabalhadores. Precisamos progredir com o avanço da tecnologia,porém, não retroceder, em relação aos direitos trabalhistas. continuar lendo